por Darlan Alvarenga
Com produção e faturamento em queda, a indústria tem encolhido e perdendo competitividade e participação na economia brasileira. No ano passado, foi o setor que mais demitiu no país e, em 2016, atingiu uma ociosidade recorde, segundo mostram os indicadores de uso do parque fabril.
Na sondagem mensal feita pela FGV, a utilização da capacidade instalada na atingiu em fevereiro o menor nível da série iniciada em 2001.
No levantamento da (CNI) Confederação Nacional da Indústria, o uso da capacidade na indústria da transformação, aquela que produz bens de consumo e máquinas, chegou ao piso histórico nos meses de janeiro e fevereiro, quando o percentual médio ficou em 62%. Em março e abril, o índice ficou estacionado em 64%, mais ainda muito longe do usual e da máxima de 75%, registrada em outubro de 2013.
Em segmentos como de máquinas e equipamentos, nas montadoras e siderúrgicas, o uso médio da capacidade instalada segue abaixo de 60%. Veja gráfico ao lado
"Isso significa que praticamente um terço do que se poderia produzir não está sendo produzido, o que tem um custo e impõe ainda mais dificuldades financeiras", afirma o economista da CNI Marcelo Azevedo.
Nas empresas de médio e pequeno porte, a ociosidade é ainda maior. O empresário César Prata, da Asvac Bombas, que fabrica equipamentos para plataformas de petróleo, navios, saneamento e outras indústrias, afirma que a sua fábrica na capital paulista está operando atualmente com apenas 40% da capacidade.
“O ideal de qualquer máquina é estar operando o tempo todo. Toda máquina tem um custo de amortização, então imagina usar só por um terço do tempo”, diz o dono da empresa, que da usual rotina de 3 turnos passou a operar com apenas um, e com um quadro reduzido. A fábrica, que no auge chegou a ter 50 funcionários, hoje emprega apenas 14.
No acumulado do primeiro trimestre de 2016, a indústria da transformação eliminou 69 mil vagas. Nos últimos doze meses, o setor perdeu cortou 700 mil trabalhadores com carteira assinada.
Desde 2014, a indústria já fechou 845 mil postos de trabalho. Foi o setor que mais demitiu no período, respondendo por 58% das vagas eliminadas no país. Em março, o total de trabalhadores no setor somou 7,55 milhões de pessoas, retornando a níveis de 2010, segundo números do Ministério do Trabalho.
O setor industrial está operando no nível mais baixo desde 2003, segundo dados do IBGE. Em 2015, a produção caiu 8,3%, o maior recuo já registrado pelo IBGE. No primeiro trimestre de 2016, a queda acumulada é 11,7%.
O PIB (Produto Interno Bruto) da indústria amargou uma queda de 6,2% em 2015, ao passo que a economia do país recuou 3,8%. Para 2016, a CNI prevê um "tombo" de 5% no PIB da indústria da transformação, mais uma vez maior que o da contração geral da economia.
A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, explica que o setor vem perdendo dinamismo e competitividade desde 2011, impactado principalmente pelo crescimento da entrada de importados, baixa produtividade e aumento real dos salários.
“De 2014 para cá, a indústria passa a sofrer também com a brutal queda da absorção doméstica, tanto do consumo quanto do investimento. E quando se tem muita ociosidade, as empresas acabam reduzindo muito as suas margens", diz a analista.
O empresário César Prata afirma que sua fábrica vive o "pior momento" em 33 anos de atuação no mercado.
Segundo ele, o faturamento caiu de 15% a 20% ao ano nos últimos 3 anos. "Passamos de uma produção de 400 bombas por ano para 170”, diz o dono da Asvac.
Na melhor fase, entre 2012 e 2013, a empresa chegou a operar perto da sua capacidade máxima. “Quando ainda não tinha Lava Jato, havia muito investimento da Petrobras, não tinha empreiteiro preso e a economia estava ativa ainda, a taxa de ocupação chegou a 90%”, conta o empresário.
Embora preveja um ano muito parecido com 2015 em termos de vendas, para ele a mudança de governo melhora as expectativas em relação ao futuro.
“Pelo menos aquele pessimismo coletivo sem horizonte e sem luz no fim do túnel foi estancado. Mesmo que os números não tenham alterado em absolutamente nada ainda, já tem esse astral de melhora”, diz Prata.
O índice de confiança dos empresários medido pela CNI registrou em maio a maior alta desde 2010 e somou 41,3 pontos. O resultado abaixo dos 50 pontos, no entanto, mostra que o pessimismo ainda segue em nível crítico.
“A expectativa ainda é que vai piorar, mas reduziu o número de empresários que acredita na piora”, resume Renato da Fonseca, que coordena a pesquisa.
Ou seja, os empresários da indústria continuam esperando queda da demanda nos próximos seis meses e projetando mais demissões.
“O ajuste fiscal por mais que tecnicamente esteja certo, o efeito mais imediato das primeiras medidas da nova equipe econômica pode ser uma pancada”, diz o economista da CNI, citando o debate sobre a revisão da meta fiscal e possível elevação de de tributos.
A retomada da confiança é apontada como primeiro passo para uma retomada do crescimento, pois é a expectativa de melhora em relação ao futuro que irá motivar o empresário a voltar a investir, aumentar a produção e a planejar estoques maiores.
"A maioria dos empresários ainda está sem coragem para investir e se preparar para uma demanda maior. Por outro lado, a boa notícia é que tem aumentado o número de empresas que tem investido em melhorias de processos visando ganho de produtividade (produção maior com menor custo)", diz Fonseca.
O setor e os analistas trabalham com o cenário de uma leve recuperação a partir de 2017, mas as indústrias só devem voltar a contratar quando conseguirem reduzir a ociosidade.
"Primeiro temos que aumentar a produção aproveitando ao máximo o quadro atual", diz o dono da Asvac. "O ritmo de recontratação irá depender também da capacidade do novo governo de mexer nas leis trabalhistas, que são aquelas que sempre encabulam o empresário de contratar”, completa.
A consultoria Tendências projeta que, após uma retração ao redor 4% neste ano, a economia brasileira irá crescer 1,2% em 2017, com o PIB industrial subindo 2,6%, impulsionado por investimentos em infraestrutura e novas concessões. “Olhando para frente, acreditamos que a indústria poderá recuperar um pouco da competitividade seja por causa do câmbio, seja no custo unitário do trabalho”, afirma Alessandra Ribeiro.
Segundo a economista, o dólar alto e, ironicamente, o aumento do desemprego tem contribuído para a indústria nacional recuperar parte da competitividade perdida. “Com o câmbio depreciado, a indústria fica mais competitiva lá fora porque reduz o seu preço em dólar e fica mais competitiva aqui dentro também porque o produto importado já não entra tanto. E com o aumento da taxa de desemprego, os salários desaceleram e isso para a indústria é um alívio na verdade, porque salário é um grande custo", explica.
Ela salienta, porém, que só mesmo a retomada do investimento e volta da demanda é que garantirão uma recuperação da indústria. "Como a ociosidade é muito grande isso pode ajudar numa retomada mais rápida. Mas a questão é ter demanda. Tendo demanda, como a capacidade já existe, é só produzir", conclui.