Documento do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, lista vários eventos que indicam "crimes de natureza grave" praticados pelo deputado
"Qualquer coisa que acontece no conselho vira manobra",
reclama Eduardo Cunha
São Paulo - O presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi notificado na manhã de ontem para se manifestar a respeito do pedido de afastamento do cargo de deputado federal e, consequentemente, das funções na presidência da Casa apresentado no fim do ano passado pela Procuradoria-Geral da República. Ainda ontem, Cunha protocolou um mandado de segurança no Supremo Tribunal Federal (STF) para garantir novos prazos de defesa no processo disciplinar que corre no Conselho de Ética. Os advogados dele tentam garantir prazo de dez dias para defesa após a indicação de novo relatório e evitar um aditamento proposto pelo PSOL e pela Rede. Os dois partidos apresentaram um aditamento no processo por quebra de decoro no qual acrescentaram informações da delação premiada do lobista Fernando Soares, conhecido como Fernando Baiano.
O pedido de afastamento foi protocolado em 16 de dezembro no gabinete do ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, e deve ser analisado em plenário pelos 11 ministros do tribunal.
No pedido, de 183 páginas, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, lista vários eventos que indicam "crimes de natureza grave", com o uso do cargo a favor do deputado, integração de organização criminosa e tentativa de obstrução de investigações criminais. Cunha é suspeito, por exemplo, de apresentar emendas em 11 medidas provisórias de interesse de empreiteiras e bancos, de ameaçar o relator do Conselho de Ética que o investiga e de usar a CPI da Petrobras para "constranger e intimidar testemunhas" de supostos crimes de corrupção cometidos por ele.
"Eduardo Cunha tem adotado, há muito, posicionamentos absolutamente incompatíveis com o devido processo legal, valendo-se de sua prerrogativa de presidente da Câmara dos Deputados unicamente com o propósito de autoproteção mediante ações espúrias para evitar a apuração de sua conduta, tanto na esfera penal como na esfera política", escreveu Janot na peça.
O procurador-geral afirma que o objetivo da medida é garantir a ordem pública para evitar nova prática de crimes e manter o "regular andamento" da investigação. Janot diz que o afastamento não é a medida mais drástica que poderia ser tomada - mais grave seria um pedido de prisão preventiva que, segundo Janot, foi descartada em "um primeiro momento".
Segundo a Procuradoria, as ações de Cunha para interferir na investigação e no processo de apuração interna no Conselho de Ética da Casa são "evidentes e incontestáveis".
Ontem, a deputada Jozi Araújo (PTB-AP) foi indicada pela bancada de seu partido na Câmara para substituir Nilton Capixaba (PTB-RO) como membro titular no Conselho de Ética. Um dia após a divulgação de que substituiria Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP) no colegiado, Capixaba renunciou à vaga alegando que não dispunha de tempo para participar das reuniões.
Capixaba tinha sido indicado para o Conselho de Ética por Jovair Arantes, após Faria de Sá renunciar à vaga de titular, em troca da promessa de ser indicado por Arantes para a presidência da Comissão de Seguridade Social da Casa. A manobra visava a beneficiar o presidente da Câmara, que é alvo de processo por quebra de decoro parlamentar no colegiado.
Cunha nega a manobra e diz não interferir nas indicações de Jovair, seu aliado de primeira hora. "Qualquer coisa que acontece no conselho vira manobra. Eu sei lá o que o PTB fez ou deixou de fazer. Eu tenho lá a ver com o que o PTB faz ou que os outros partidos fazem. Quantas pessoas já saíram e voltaram do conselho nesse período?", afirmou Cunha.
Fonte: Folha de Londrina, 17 de fevereiro de 2016; fetraconspar.org.br