A internet ainda enfrenta problemas no Brasil, com apenas 51,6% da população on-line e ocupando a 84ª posição do ranking global Networked Readiness Index, elaborado pelo Fórum Econômico Mundial. Mas, no cenário externo, o país exerce papel central nos debates sobre governança, tanto que é o único a sediar em duas oportunidades o Fórum de Governança da Internet (IGF, na sigla em inglês, organizado pelas Nações Unidas), além de ter sido palco do NETMundial.
— Definitivamente, o Brasil tem exercido um papel de liderança, um ator e negociador chave nas conversações — disse o secretário-geral assistente da ONU para o Desenvolvimento Econômico, Lenni Montiel, representante do secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, nesta edição do IGF. — O Brasil é o único país no mundo a sediar o IGF em duas oportunidades, isso é um forte indicador do interesse do país em contribuir para as conversações globais sobre o desenvolvimento do uso da internet pela sociedade.
Segundo Montiel, o papel do Brasil nas negociações sobre o tema nas Nações Unidas é “bastante apreciado”, e esse desempenho é explicado pela “comunidade vibrante relacionada à internet no país”. O secretário destacou a atuação do Comitê Gestor da Internet (CGI.br), por mostrar “precisamente o que ser multissetorial significa, com representantes do governo, setor privado, sociedade civil e academia”.
— O Brasil é pioneiro em muitos aspectos no modo multissetorial em que esperamos que a internet continue sendo gerida — destacou Montiel.
Apesar do atraso em aspectos econômicos e de infraestrutura, o país desempenha papel de destaque nos debates sobre a internet desde o início da rede. O CGI.br, citado por Montiel, adota o modelo multissetorial desde a sua fundação, em 1995. A própria ICANN (Corporação da Internet para Atribuição de Nomes e Números), um dos principais órgãos de governança, subordinada ao governo americano, só foi criada três anos depois.
Demi Getschko, diretor-presidente do NIC.br (Núcleo de Informação e Coordenação do Ponto BR) e membro do CGI.br, destacou ainda o decálogo de Princípios para a Governança e Uso da Internet no Brasil, que serviu de base para o Marco Civil e para a carta de princípios aprovada pelo NETmundial.
— Não existe uma deficiência conceitual da internet. O Brasil teve o Comitê Gestor em 1995, gerou o decálogo em 2009, o Marco Civil no ano passado. Em suma, o Brasil tem vários aspectos que são considerados referência internacional na área — pontuou Gestchko.
Durante esta semana, João Pessoa, na Paraíba, foi sede da décima e, até então, última edição do IGF. O fórum é convocado pelo secretário-geral da ONU em resposta a mandato de dez anos estabelecido pela Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação (WSIS, na sigla em inglês) em 2005, e se transformou no principal encontro global multilateral de discussões sobre políticas públicas relacionadas à governança da internet.
— De fato, esta será a última edição do mandato em vigor, mas a boa notícia é que, pelo que estamos escutando, existe um consenso crescente de que o Fórum de Governança da Internet será estendido — revelou Montiel. — Isso será decidido em Nova York, nos dias 15 e 16 de dezembro, na Assembleia Geral das Nações Unidas, quando um encontro de alto nível vai rever o WSIS +10. É uma boa notícia, mas eu não posso dizer que vai acontecer, porque ainda precisa ser endossado pelos Estados-membros.
Por ser um fórum, o IGF não tem poder decisório, o que, na visão de Montiel, acaba favorecendo os debates. Em cúpulas decisórias, os participantes vão com propostas fechadas, com estratégias de negociação de acordo com interesses próprios, e sem a participação de todos os setores interessados.
— O que nós fornecemos é uma plataforma para a discussão de conhecimento e propostas de ponta. Em termos, os Estados-membro absorvem essas informações para embasar suas decisões — disse Montiel. — O que importa é que o fórum é o único espaço no mundo, em que todos os anos atores do setor privado, governos e sociedade civil se reúnem para trocar ideias, boas práticas, identificar problemas e fazer propostas.
FONTE: O Globo, 16 de novembro de 2015; fetraconspar.org.br